domingo, 28 de novembro de 2004

Só um corpo

Um dia havia toda uma vida a correr por mim por fora por dentro, havia um sol, uma lua, um céu sempre a azular, um fogo que ardia longe no horizonte, até um sorriso a ondular os campos. Um dia havia eu e o que havia de mim num corpo, numa existência talvez, andando por algo a que chamava realidade, que de facto podia muito bem nem ser real. Um dia o fogo apagou-se e o céu caiu. Um dia o sol desligou-se e a luz escureceu. Um dia houve um desaparecimento de sorrisos, e deixei de haver eu em mim.

Por isso, um dia, ficou só um corpo, numa inexistência qualquer.

sábado, 27 de novembro de 2004

Criar é Humano

É absolutamente fantástico o que um pouco de imaginação é capaz de produzir. E é tão fácil deixar que ela flua ao seu próprio ritmo para nem sequer necessitarmos se nos preocupar.
Já o disse, contudo não hesito em repetir que é a nossa parte criativa que vale ainda mais que tudo em nós e que só criando é possível apercebermo-nos tanto da nossa essência, como da vida que a precede e a possibilita.
Por tudo isto é indiscutível, pelo menos para mim, que se somos alguma coisa maior do que nada, à escala universal, é porque possuímos essa extraordinária capacidade de imaginarmos e criarmos infinitas possibilidades de concepções e realizações.

Criámos Deus à nossa imagem, porque o fizemos Criador.

sexta-feira, 19 de novembro de 2004

O Caminho Pelas Ruas

Caminho pelas ruas da cidade e olho as multidões, imunes a qualquer força que lhes altere o estado cinético, devido à sua inércia quase infinita. Mas ainda assim adivinho-lhes os sonhos – aquelas estranhas coisas que se esforçam por não dar importância – e sinto-lhes a vida. Sinto-lhes o bater de algo muito mais além do que o próprio coração. Não que seja muito maior, mas por não ser necessariamente feito de matéria positiva.

De qualquer forma, não sou mais do que um qualquer elemento da paisagem. Isto porque quem caminha por entre a multidão é arrastado por ela e raramente consegue parar para pensar. Os que param, ou têm um esgotamento, ou são internados num qualquer hospital psiquiátrico.

Mas eu caminho e quero salvá-los. Mesmo consciente do perigo que essa palavra acarreta. Mas salvá-los de quê? Bem, na verdade nem eu sei ao certo do quê. Todavia, sei que aquilo que me move se mostra tão verdadeiro a mim que tem que significar algo – ainda que pouco – para todos os outros.