quarta-feira, 27 de abril de 2011

O que realmente faz falta!



O que faz falta não é (apenas) animar a malta. O que nos faz falta é sentir. Saborear. Correr. Respirar. O prazer e a satisfação não vêm apenas do que é doce, e os perfumes mais inspiradores não cheiram necessariamente a flores. Sim, a vida é onde se fazem os filmes da disney; mas a vida não é um filme da disney. Na vida não há bons nem maus. Heróis ou vilões. Na vida não há finais felizes daqueles em que o que se ganha quase sem esforço se torna nosso para sempre - no matter what. Não. A vida é muito mais do que isso. A vida está viva. Não há infinito na vida. Não há para sempre. Não há direitos adquiridos. A vida é a vida. É uma luta constante contra a entropia. É uma luta que, individualmente, vamos sempre perder, mas que juntos podemos vencer. A vitória perpétua, o adquirido, o vitalício, o “para sempre” - nada disso é vida. A isso, ao para sempre, ao que não vai mudar nunca e é adquirido, não se chama vida. Mas existe. Chama-se morte. Chama-se baixar os braços. Desistir. Por isso, o que faz falta, o que faz mesmo, mesmo falta, é viver. É amar. É dar. É darmos as mãos e chegarmos mais longe. Lutarmos para, não contra. Descobrir. Viver. Viver. Viver!

terça-feira, 26 de abril de 2011

Linhas que dividem para Unir

Às vezes desenhas linhas sobre os campos onde se cultiva vida. A tua vida. Como que tentando dividir. Separar. Só que não é para separar. Dividir é unir. Unir verdadeiramente. Pelo menos se o muro for baixo. Se conseguirmos ver o que há para lá. Se convidar à conversa com o vizinho. Com as outras dimensões da vida. Com o mistério que há para além de um muro. E tu tentas sempre dividir bem, para unir melhor.

Nos campos que são a tua vida traças linhas rectas. Esforças-te. Formas geométricas para áreas métricas e superfícies perfeitas. Mas o mundo não é quandrangular, não se resume a rectas, não se paralelisa tão simplesmente. E tu sabe-lo. Por isso libertas-te na divisão. Quebras a noção perfeita de perfeição para a tornar mais humana. Para a tornares humana. Porque a perfeição de linhas rectas só cheira e sabe a perfeição para quem não sabe o que é ser humano, para quem nunca viu o mundo como tu o viste. Por isso esqueces a matemática das linhas perfeitas e dás-lhes aquele travo amargo de cada grão individual de café, amadurecido na encosta de uma montanha distante. Salpicas grãos de canela. Lanças o perfume de pétalas de flores cujo nome desconheces, mas o perfume te inspira sonhos, e salgas tudo com o mar inteiro. O mar inteiro. Estilhaças e partes edifícios gigantes, sopras o vapor de comboios que outrara percorreram o mundo e que hoje são só memórias, e queimas a gasolina que se há de queimar toda até não haver mais. Num cheiro intenso. Num sabor que explode, na intensidade de se estar vivo. Divides e re-divides. Humanamente. Imperfeitamente, porque é a imperfeição que melhor sabe a vida. E sem receitas ou fórmulas, saltas os teus próprios muros e quebras fronteiras acabadas de criar.

Às vezes desenhas linhas no campo onde crescem as tuas memórias, onde amadurecem os teus sorrisos, onde os teus sonhos proliferam. Onde as lágrimas chovem. Onde a mágoa sopra em tempestade. Às vezes desenhas linhas sem saberes ou te aperceberes que, ao desenhá-las, ao escreve-las em ti, pintas versos e frases e textos e música num Universo que podes tocar e sentir e criar, mas que, a cada segundo, se estende, mais e mais, para além de ti, até ganhar as suas próprias asas e saber voar, rumo ao infinito. Às vezes desenhas linhas no campo da tua vida, para dividir e unir o que és. E ao fazê-lo, tornas o mundo de todos os que te rodeiam tão melhor.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Mundo-Mundos


O Mundo é uma bola. É plano. É finito. Nunca acaba. No fim do mundo cai-se num abismo sem fim. O fim do mundo não existe. O nosso Mundo roda sempre sem parar, frenético. É estático. Constantemente em mudança. Nunca muda. É imperfeito. Fantástico. Corrupto. Vivo. O Mundo é um Universo. O Mundo é uma formiga. É mais pequeno do que uma formiga. O Mundo nem se vê. O Mundo somos nós. O Mundo é infinito. É tão maior que nós que nem nos vê. O Mundo. O Mundo. O Mundo. Esquerda. Direita. Para a frente e para trás na 5ª dimensão. Dividido e Paradoxal, o mundo é mais unido. O Mundo é o mundo.

domingo, 24 de abril de 2011

Página Em Branco


Às vezes quando escrevo, deixo assim uma página em branco. Pelo menos uma. Um zero. À esquerda. Uma página em branco à esquerda. Só porque sim. E porque não. Mas sobretudo para irritar o bicho papão. E o outro parvalhão. Para chatear cada politiquês, cada economicistista, cada explorador de cidadão, profissional ou amador, declarado ou ainda no armário. Daqueles cromos que sairam das cadernetas e que a toda a hora dizem e gritam e cantam défice, ratings, crise e vivem tudo isso com muito mais fé do que os crentes vivem a fé no deus deles.


Eles irritam-se tanto com uma página em branco. Totalmente em branco. Uma página em branco chateia-os. É um zero que nem sequer chega a sê-lo. É o nada. E isso irrita-os profundamente, porque não o conseguem dividir como os tachos; porque já não há nada a tirar, nada a roubar; não dá para multiplicar, hipotecar, vender, alugar ou privatizar. Sim, uma página em branco, o nada, é o pior pesadelo do economicistista, do explorador de cidadão, do agricultor de crises. Uma página em branco não tem défice, não dá para aplicar austeridade. De nada vale aumentar o Iva numa página em branco. Pior ainda: numa página em branco ninguém é especialista, não há receitas, não há fortunas, não se vai à TV, não se fazem comícios. Uma página em branco não lhes dá um motorista. Nem sequer lhes dá um voto.

É por isso que às vezes quando escrevo deixo uma página em branco. Porque não há nada mais fantástico, mais inspirador e revelador do que uma página em branco.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Álvaro e os Campos


Sabes, um dia um Professor deslocado deu-me um livro. Acho que era um prémio. Ou um rebuçado. Não sei bem já. Mas era um livro. De poemas. Não, de poesia. Sim, um livro de poesia. Era diferente o livro, sabes. Os poemas são rios e os rios são belos e frescos e moldam vales e tornam-nos férteis ao longo das montanhas. Mas a poesia, a poesia é a água toda, também dos rios, mas sobretudo dos mares e Oceanos. E esse Professor deu-me um livro cheio de um mar que é a poesia. De Fernando Pessoa quando ele era Álvaro de Campos. Um livro de quando o Álvaro de Campos era o Fernando Pessoa e as suas mãos escreviam num papel que já não há. Num tempo que já foi e não vai voltar nunca.

Nesse dia não me lembro do que pensei. Se quis ser como o Professor deslocado que falava o tugalês com sotaque a pint, se queria beber pints com sotaque tuga, se queria ser o Fernando Pessoa a ser o Álvaro de Campos, se queria ser o Álvaro de Campos a ser o Fernando Pessoa, ou se queria ser apenas aquele leitor, ali mesmo, a mergulhar na poesia.

domingo, 17 de abril de 2011

Cada


Em cada cor há um texto para pintar
em cada gesto uma melodia para dançar
um padrão que se repete
um sol que não se põe
um horizonte que se estende
para além do infinito.

Em cada segundo que não pára
há um poema que não lemos
um filme que não vemos
um chá que arrefece.

A cada som, a cada choro
a cada brilho escuro em nós e por nós criado
há uma guerra de um silêncio que nunca sabemos
como terminar.
E cada corpo, cada passo por dar
ao ritmo e forma do compasso
faz da vida a escolha mais profunda
- morrer vivendo
ou viver a morrer.




O sabor da escrita.


Não é a prática, por si só, que matura a escrita e lhe dá aquele sabor único a vida e a mar. A sal, a pimenta, a caril e a alecrim. A álcool. A água. Não é a insistência ou a persistência por si só que dá o sabor à escrita. Talvez lhe dê um certo perfume que atrai - e por um instante domina - mas não é isso, nunca é isso que salga a escrita.

O que verdadeiramente matura a escrita é a vida. Cada lágrima. Cada sorriso. Cada sonho. Cada desilusão. O mundo inteiro. Mil viagens. Lixo. limpeza.


O que matura a escrita é sentir o mundo. Ontem agora, amanhã. Desta, daquela, de todas as maneiras. Sem filtros, com filtros, com óculos, sem telecópios, aqui e além.


sábado, 16 de abril de 2011

Livros: uma espécie em vias de extinção


Será que ainda se escrevem livros a sério? Daqueles em que as palavras se criam numa dança de papel e tinta? Daqueles escritos ao luar, num beijo ao estalar da lareira, ou ao som do bater das ondas na areia?

E será que ainda se lêem livros a sério? Mão na mão, com pausas para respirar o papel, para sentir as páginas e ouvirmos a tinta no papel? Com tempo para respirar a criação de mundos e pensamento e Universos que, na verdade, nunca existirão? Ou seremos já nós mesmos, as máquinas que tanto temíamos?

Pensamentos à beira de todo o lado

I

Céu

Lá fora há vida, mas quase não há luz. Há verde. Talvez sorria a vida, lá fora. Com aquela felicidade que nos faz ser estrelas e vida e sonho. Mas está escuro. Não há sol e o céu é cinza. Escuro. Mas também não chove. Mas tu não estás aqui. Por isso está escuro. É por isso que está escuro.

II

Caledonian Crescent

Às vezes damos por nós em locais que não só não esperavamos estar, mas sobretudo lugares que nem sabiamos que existiam. Como hoje, aqui.

III

Há na força da Terra
expressa no som da água a correr como se o fosse fazer para sempre
algo profundamente atractivo. Natural.
Fascinante.

IV

Não importa que a palavra possa parecer esgotar-se. Que o cansaço pareça ganhar. De nada vale lutarmos de mais - desesperadamente, obsessivamente -, quando a luta se torna contra nós mesmos. E, às vezes, o que é preciso é respirar. Largar o peso que carregamos aos ombros e inspirar fundo. Olhar o mar, sentir o silêncio - as várias famílias e espécies de silêncio - ou o frenético buzinar do mundo. Afastarmo-nos do Universo para nos encontrarmos nele novamente. Para o podermos ver novamente. Senti-lo, cheira-lo, sabê-lo.

Por isso de nada vale a profunda inquietação. Não vale a pena gritar. De nada (ou pouco) vale seguirmos assim, nessa ânsia de chegar, de tal forma exaustos que já nem sabemos onde estamos, nem para onde vamos.

Por isso relaxa. Respira. Dá a mão a quem a estende. Estende a mão a quem precisa. Fecha os olhos e acredita. Amanhã, quando a Terra se virar novamente para o Sol, o mundo terá muitos mais sorrisos.

V

Às vezes perguntas-me
se as coincidências que por vezes chovem
são de uma água que não é daqui.
Se são fruto de um fruto
que não se fez aqui.
Por vezes há um dejá-vu
sem fim.
Um nome que retorna
um lugar que relembra.
Um mundo tão distante
e que nos é como a palma
da nossa mão.
E eu nunca te respondo verdadeiramente.
Sorrio apenas.
Sorrio, e partilho contigo
este arrepio profundo
que nos percorre o corpo
e nos explode a mente.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Antigamente


Antigamente, quando eramos pobres e in-evoluídos o suficiente para pisar a Lua e para sonhar com as estrelas, tinhamos - por vezes - visões aterradoras de um futuro que estava para vir. Uma Era dominada por robots e máquinas; um mundo em que a inteligência artificial tomaria conta do Mundo inteiro, transformando-o à sua imagem; cultivando apenas eficácia, produtividade, perfeição, crescimento (viva o FMI!). Sem espaço para a arte, ou a paixão. Sem espaço para um pôr-do-sol, ou uma noite quente de Verão.


E estávamos certos. Essa Era chegou, finalmente. Mas, ao mesmo tempo, errámos completamente. Não nas consequências, mas nos intervenientes. Porque neste mundo onde já não se pode nem deve sonhar; onde a produtividade e dedicação totais às actividades económicas é o que mais importa, e onde não há espaço para humanos, não existem robots de inteligência artificial avançada. Existem, isso sim, humanos de inteligência robótica. Skynet chegou, e é feita por cada um de nós que i-vive rodeado por um mundo que i-há-de i-controlar-nos a itodos.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Palavras

As palavras são algo de exraordinário. Como uma vibração que se torna uma melodia, como uma textura que se torna uma forma; as palavras não existem e, ainda assim, fazem-nos sentido. As palavras, como os gestos e os sorrisos, são as pontes que ligam essas cidades estridentes e poluídas que somos todos nós. As palavras são algo de fantástico, porque ao criarmo-las reinventamo-nos, a nós, ao mundo em que vivemos, e ao Universo inteiro que nos acolhe e rodeia.